Quando somos pequenos costumamos ser ensinados gradativamente a categorizar. Isso nos auxilia muito na construção de alguns conceitos e no desenvolvimento da lógica e da coerência. Formamos grupamentos de acordo com números, cores, sons ou utilidades. Aprendemos a criar padrões, protótipos e moldes. E essa forma de funcionamento pode nos acompanhar em boa parte de nossa história.
Não há nada de contraditório no pensamento cartesiano. Ao contrário, no inicio de nossa narrativa ele se torna inclusive altamente eficaz no que tange a aquisição de novos conhecimentos e na subsequente formação de categorias, classes e hierarquias. Contudo, quando seguimos usando o mesmo exemplo matemático na vida adulta, corremos um alto risco de impor normas métricas às pessoas.
Quando cristalizamos o conceito de normalidade, dizemos basicamente que apesar dos desvios padrões existentes, temos uma média do que é esperado para os comportamentos, pensamentos ou emoções de cada um. Entretanto, essa forma de pensar suprime por completo a singularidade. Ao exigir que tenhamos um modelo, tudo o que destoa acaba sendo classificado como errado, censurável ou inconveniente. E essa é uma das origens de nossos preconceitos.
Em meio a tudo isso, ainda hoje, existe muita discriminação quanto aos portadores de transtornos mentais. Àqueles que não se encaixam no funcionamento esperado pela sociedade, se percebem muitas vezes segregados. Recebem estigmas que intensificam negativamente seu quadro. Isso quando não são deliberadamente apartados ou impelidos compulsoriamente a ficarem à margem da vida social ou laboral.
Essa psicofobia afasta a cada vez a possibilidade de tratamento. Ao se perceberem rejeitadas, as pessoas acometidas com doenças psíquicas desenvolvem ainda mais resistência quanto à necessidade de se cuidar. Desse modo, perceber o sofrimento emocional e mental como algo real, desconstruindo representações sociais, é essencial. Ainda que, num primeiro momento, o diferente possa parecer assustador, apenas acolhendo as dissemelhanças criamos verdadeiras pontes na direção da empatia e do acolhimento do outro.
Nesse sentido, boa parte do nosso amadurecimento é composto pela capacidade de desconstruir arquétipos aprendidos na infância e pela expansão de nossa aceitação para um espectro de possibilidades. Entender que categorias funcionam para coisas, não para pessoas e que, portanto, essa inclusão se faz necessária e iminente é o ponto de partida para uma sociedade não apenas mais gentil como também muito mais justa.